ACÓRDÃO DO CONSUP N.º 1014/2020 (PUBLICADA NO DOE DE
03.09.20)
Processo n.º 202000004058807
Apreciação de Proposta de Súmula n.º 002/20
Interessado: CONSELHO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO -
Autor da Proposição: Conselheiro Washington Luis
Freire de Oliveira
Relator: Conselheiro Fábio Eduardo Bezerra Lemos e
Carvalho
Representante Fazendário: Dr. Moyses Miguel da
Silva Jr
SÚMULA Nº 004: A exigência de
multa formal isolada, relativa à omissão de registro de entrada de mercadoria
apurada por meio de Auditoria Específica de Mercadorias, deve ser reduzida em
razão da aplicação da forma privilegiada da penalidade, prevista no § 8º do
art. 71 da Lei n.º 11.651/91 (Código Tributário Estadual – CTE).
ACÓRDÃO – O
Conselho Administrativo Tributário, manifestando-se pela totalidade dos
Conselheiros efetivos, decidiu, por unanimidade de votos, aprovar a Súmula 004
com pequenos ajustes na proposta original, assim redigida: “A exigência de
multa formal isolada, relativa à omissão de registro de entrada de mercadoria
apurada por meio de Auditoria Específica de Mercadorias, deve ser reduzida em
razão da aplicação da forma privilegiada da penalidade, prevista no § 8º do
art. 71 da Lei n.º 11.651/91 (Código Tributário Estadual – CTE)”, votaram os
Conselheiros Fábio Eduardo Bezerra Lemos e Carvalho, Simon Riemann Costa e
Silva, Victor Augusto de Faria Morato, Paulo Diniz, David Fernandes de
Carvalho, Emircesar Gonçalves Baiocchi, Virgínia Pereira de Menezes Santos,
André Luiz Cançado Thomé, Cícero Rodrigues da Silva, Marcus Moreschi de Faria,
Valéria Cristina Batista Fonseca, José Pereira D’Abadia, Evandro Luís Pauli,
Rickardo de Souza Santos Mariano, Washington Luiz Freire de Oliveira, Valdir
Mendonça Alves, Denilson Alves Evangelista, Paulo Henrique Caiado Canedo,
Gláucia Félix Bastos Cruzeiro e Samuel Albernaz.
R E L A T Ó R I O
Foi proposto pelo Conselheiro
Washington Luís Freire de Oliveira a edição do seguinte enunciado de súmula:
A exigência de multa formal
isolada relativa a omissão de registro de entrada de mercadoria apurada por
meio de Auditoria Especifica de Mercadorias deve ser reduzida em razão da
aplicação da forma privilegiada de penalidade prevista no § 8º do art. 71 do
CTE (Código Tributário Estadual – Lei 11.651/91).
A proposta tem entre os seus
objetivos tornar obrigatória, no âmbito do CAT, a aplicação do § 8º quando não
se exigir ICMS na omissão de entrada apurada mediante a análise do fluxo
quantitativo da mercadoria, ou seja, quando há o mero descumprimento da
obrigação acessória de registrar a entrada da mercadoria.
Foram apresentados 06 (seis)
julgados, dos Conselhos Superior e Pleno, para cumprir o requisito imposto pelo
art. 22, e seu § 1º, da Lei n.º 16.469/09:
Acórdão |
Ratio Decidendi |
877/12 Conselho Pleno |
(...) da irregularidade praticada não resultou, ainda que indiretamente, falta de pagamento do imposto (...) (...) a apuração da diferença só foi possível porque o sujeito passivo promoveu a saída da mercadoria acobertada por documentação fiscal. |
1437/17 Conselho Superior |
(...) há elementos a indicar que essa infração, ainda que indiretamente, não resultou falta de pagamento do imposto (...) A própria auditoria assegura que essa mercadoria que entrou no estabelecimento sem nota fiscal saiu do estabelecimento acobertada de nota fiscal. |
163/19 Conselho Superior |
(...) o único reparo que é mister realizar na decisão recorrida é quanto à aplicação da forma privilegiada da multa descrita no art. 71, §8º do CTE, que é nitidamente mais benéfica que a redução aplicada por força do §11º do mesmo dispositivo legal (...) |
449/19 Conselho Superior |
(...) por se tratar de omissão de entrada cujo imposto foi recolhido nas saídas, cabe a aplicação da forma privilegiada prevista no § 8° do art. 71 do Código Tributário Estadual (CTE). |
338/19 Conselho Superior |
(...) verifico que a omissão praticada pelo contribuinte, de ordem acessória, não ocasionou prejuízo ao erário estadual, o que me faculta a aplicação do §8º do artigo 71 do CTE (...) |
736/19 Conselho Superior |
Quanto ao Recurso Fazendário, o acórdão paradigma, como já dito, não trata da matéria de que cuida o objeto do recurso, que é a aplicação da forma privilegiada da penalidade (§ 8º do art. 71 do CTE), não servindo esse como razão de admissibilidade do recurso. |
A proposta foi recebida pelo
Presidente do CAT, o relator foi sorteado, foi pautada para julgamento em
sessão específica no dia 31/08/2020, foi dado amplo conhecimento à totalidade
dos Conselheiros e foi notificado o Assessor Especial da Representação
Fazendária para a apresentação de parecer.
Até o 10º (décimo) dia
anterior à data prevista para a sessão de julgamento da proposta, nenhuma
redação alternativa havia sido entregue à Secretaria- Geral, além da contida no
parecer da Representação Fazendária.
A Representação Fazendária
apresentou no seu parecer uma argumentação muito bem elaborada para justificar
que concorda com a proposta somente se for acrescido ao final do enunciado a expressão “... quando não houverem elementos de
prova da omissão indireta do pagamento do imposto.”
O único julgado
administrativo trazido pela Representação Fazendária tratou do § 8º em questão,
mas no caso de extravio de notas fiscais.
Não fizemos redação
substitutiva que harmonizasse a redação originalmente proposta com a
alternativa apresentada pela Representação Fazendária.
É o relatório.
VOTO
Para fazer as análises da
proposta de enunciado e do parecer da Representação Fazendária, adotaremos um
quadro teórico no qual as súmulas se particularizam como enunciados sobre as
decisões do tribunal, e não como uma decisão que se qualifica como precedente,
de modo que nos preocuparemos apenas com a adequada delimitação do enunciado
jurídico, como sendo a síntese da tese que retrata os precedentes do CAT sobre
a matéria. Por isso, torna-se necessário nos atermos às circunstâncias fático-jurídicas
que deram azo à formação dos precedentes subjacentes (art. 926, § 2º, do CPC).
Portanto, nesse quadro
teórico a nossa análise da proposta do enunciado limitar-se-á à verificação da
validade do enunciado proposto, no sentido de aferir se ele retrata os julgados
do Conselho Superior apresentados pelo proponente, bem como se ele limita sua
aplicação às circunstâncias fático-jurídicas do julgados trazido para sustentar
a proposta. No mesmo sentido, a proposta de alteração do enunciado contida no
parecer da Representação Fazendária, será verificada pelo mesmo método.
Com efeito, conforme tabela
sintetizada no relatório, é possível verificar, inicialmente, nos seis julgados
trazidos pelo proponente, que as normas particulares e concretas foram
deduzidas sobre as mesmas circunstâncias fático-jurídicas, ou seja, exigiu-se
apenas multa formal, e ela foi reduzida pela aplicação do § 8º do art. 71 do
CTE, quando constatada a omissão de registro de entrada apurada na Auditoria
Específica de Mercadoria cuja tributação ocorre na saída.
A norma é o resultado de uma
outorga de sentido ao texto legal pelo seu destinatário, de modo que, ao
fazerem as ligações da hipótese prevista no texto do § 8º aos casos concretos,
os julgados expressaram as razões por que entenderam que ocorreu a subsunção.
Da análise dos acórdãos citados pelo proponente, pode-se extrair elementos
comuns que são os formadores dessas razões para justificar a aplicação do § 8º
aos casos apresentados. A tabela abaixo retrata sinteticamente essas razões.
Razões de Decidir Depreendidas dos Julgados |
O mecanismo matemático da Auditoria Específica de Mercadoria assegura que a omissão de entrada de mercadoria só possa ser detectada porque houve a saída da mesma mercadoria no período auditado acobertada por nota fiscal. |
A omissão de entrada apurada por meio da Auditoria Específica de Mercadoria cujo imposto é recolhido na saída do estabelecimento fiscalizado constitui-se em mero descumprimento de obrigação acessória, que tem natureza formal, e não resulta,ainda que indiretamente, falta de pagamento do imposto. |
Então, o enunciado proposto,
a meu ver, retrata bem as decisões paradigmas, pois ele identifica a
circunstância fático-jurídica adequadamente, referindo-se aos fatos que
configuram a infração, aos quais a súmula deverá ser aplicada depois de
aprovada, como sendo “a exigência de multa formal isolada relativa a omissão de
registro de entrada de mercadoria apurada por meio de Auditoria Especifica de
Mercadorias”.
Vejam que a exigência de multa formal isolada relativa a
omissão de registro de entrada de mercadoria apurada por meio de Auditoria
Especifica de Mercadorias só ocorre quando a mercadoria for tributada na
saída do estabelecimento fiscalizado. Além disso, essa omissão não resulta em
falta de pagamento do imposto porque o mecanismo da Auditoria Específica de
Mercadorias garante que a omissão de entrada só pode ser detectada se houver
saída da mesma mercadoria do estabelecimento, no período fiscalizado,
acobertada por nota fiscal.
Dessa forma, o enunciado proposto retrata adequadamente
as decisões paradigmas, sem extrapolar os seus limites, estando nesse
quesito, apta à aprovação.
Mas, faz-se necessário
verificar, também, se a posição adotada no enunciado proposto é um entendimento uniforme e reiterado na
jurisprudência do CAT, de modo que fizemos uma pesquisa jurisprudencial com
os seguintes parâmetros:
1. Autos lavrados de 2010 em
diante cujas acusações foram omissão de registro de entrada apurada na
Auditoria Específica de Mercadorias e;
2. Autos julgados procedentes
ou parcialmente procedentes pelo Conselho Pleno e pelo Conselho Superior.
Atenderam a essas condições
32 autos de infração, cujas decisões podem ser classificadas, para o que nos
interessa, da seguinte forma:
(i) 03 (três) processos o § 8º não foi
aplicado (autuados em 2010 e 2012): 4011003780411, 4011203994946 e
4011204624042;
(ii) 04 (quatro) processos o
§ 11 foi mais benéfico e, portanto, foi preferido em relação ao § 8º (autuados
em 2015 e 2018): 4011800726291, 4011800735959, 4011500900091 e 4011502537652;
(iii) 18 (dezoito) processos
a aplicação do § 8º já foi feita pelo próprio
autuante: |
4011003911290, |
4011100530645, |
4011200626784, |
4011201031539, |
4011204649380, 4011204676433, 4011204846614, 4011301552379, |
4011301552611, |
|||
4011302144622, 4011303461214, 4011402151515, 4011403766009, 4011201832701, 4011601006787 e 4011602616716; |
4011201831810, |
(iv) 07 (sete) processos a
aplicação ocorreu no Conselho Pleno ou no Conselho Superior: 4011201669290,
4011200646203, 4011401551161, 4011600649307, 4011601240623, 4011602770391 e 4011702372266.
Verifica-se, portanto, que o
entendimento retratado pelo enunciado, ainda que não seja unânime na
jurisprudência do CAT, é francamente majoritário e uniforme nos últimos 10
(dez) anos.
Assim,
o enunciado atende também ao requisito de
uniformidade e preponderância.
Na análise do parecer do
Assessor Especial da Representação Fazendária, os seguintes fatos se mostram
determinantes:
a) O parecer abordou o
processo de aprovação de súmula como se devêssemos rediscutir a matéria do
enunciado tal como num julgamento de um caso hipotético, o que contraria a
doutrina para o procedimento de aprovação de súmula;
b) Em razão disso, não trouxe
nenhum precedente para sustentar sua proposta de alteração do enunciado (o
único precedente do CAT mencionado diz respeito a extravio de nota fiscal);
c) A pesquisa jurisprudencial
nos mostrou que em 18 (dezoito) dos 32 (trinta e dois) autos analisados pelo
relator, o próprio Fisco, ao longo dos anos, já incluía o § 8º no instante da
lavratura;
Conclui-se que o entendimento
da Representação Fazendária é minoritário, pois só 10% (dez por cento) dos
autos de infração analisados da jurisprudência do CAT o § 8º não foi aplicado
e, além disso, foram em julgados mais antigos. Em razão disso, não acolho a
sugestão de redação alternativa pois que introduziria no enunciado uma norma
que não retrata o entendimento uniforme e reiterado do CAT nessa questão.
Em face do exposto, concordo
inteiramente com o enunciado de súmula proposto, fazendo pequenas alterações
textuais conforme exposto a seguir:
A exigência de multa formal
isolada, relativa à omissão de registro de entrada de mercadoria apurada por
meio de Auditoria Específica de Mercadorias, deve ser reduzida em razão da
aplicação da forma privilegiada da penalidade, prevista no § 8º do art. 71 da
Lei n.º 11.651/91 (Código Tributário Estadual – CTE).
Sessão do Conselho Superior,
por videoconferência, em 31 de agosto de 2020.
FÁBIO EDUARDO BEZERRA LEMOS E CARVALHO RELATOR |
LIDILONE POLIZELI BENTO PRESIDENTE DO CAT |